quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

AMORES


 



Sinto-me culpada por muitos amores.
Apenas metade do Eu quer extirpar a culpa,
a outra metade quer continuar a ser livre.
Apenas metade do Eu se rende,
enquanto a outra metade cria obstáculos,
                procura escapar.

Sou juiz severo de meus atos,
julgo meus pensamentos,
                minhas intenções,
                minhas imprecações secretas,
                meus ódios secretos.
As sementes de muitas vidas,
                lugares,
muitas mulheres dentro de mim.

Um rubor invisível de vergonha
queima-me como febre.
A inocência desaparece de meus atos.
Não consigo afugentar a loucura.
Quando a vida me acorrenta,
sempre dou um jeito de escapar.
Não posso jamais seguir um único amor.

Uma febre confessional
força-me a levantar um canto do véu.
Passo sem passaporte,
                nem licença,
de um amor para outro.
Destruo a vida comum.
Minha boca mente.
Minha escada leva ao incêndio.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

AO AMOR





O amor total é perigoso demais.
Feminino demais.
Flui belo em seu brilho.
Não há sequer um fragmento errante.
Como um gesto que se origina no âmago do ser,
como uma expressão necessária.

Uma malha de luz na superfície da água.
Luz e água que afogam.
Em pequenas doses, inebria,
abrindo caminho entre dezenas de sensações.
Acaba se perdendo a alma.
A vida torna-se aguda demais.

O amor total habita meu ventre.
Com que escrutínio gélido ele me observa,
compreendendo minha fome insaciável
de um amante que ama sua mente,
e seu espírito, e sua alma, e seu corpo.
Um despencar no abismo da existência.
Tudo sob a luz do crepúsculo.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

DA SALVAÇÃO


Continuo girando a bola colorida.
Alcanço a serenidade através da exaustão;
e tudo se esvai,
                tudo se dissolve.
Meu corpo se enche de flores,
flores com dedos que me fazem carícias.
Fui capturada por um sonho.

Sou o brilho, a cor
                e os sentidos,
                e o vinho.
Vivo em um mundo de calor e luz,
desfrutando abraços.
Tudo parece mover devagar demais,
                o orvalho,
                e a unidade das coisas,
                e os seres humanos.
Me sinto possuída por poderes mágicos.

A doçura de uma perda em mim mesma,
onde me estilhaço,
                me fragmento
e meu caminho se bifurca,
e me perco, e me salvo.
Como em um sonho quente
                e apaixonado,
mas ainda assim,
                um sonho.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

OLHAR...




Ele ri com o olhar.
Respondo com todo meu eu.
Ele deseja a cor,
                o cheiro,
                a ilusão,
                e o brilho excessivo.
Ele não é eu, ele é o OUTRO.
Perfumo sua pele com meu desejo.
Fosforescência de corpo e alma.

Hoje me demoro sobre sua beleza.
Seu sorriso continua me assombrando.
A singeleza dos gestos...
Completude de dois corpos fundidos,
na mais sublime forma da pureza.

Deixe-me beijar sua sombra,
o brilho espontâneo de seus olhos.
Uma estranha riqueza de vida.
Satisfação plena,
                contentamento pleno.
Uma outra forma de penetração,
                outra infiltração,
                outra fusão.

domingo, 12 de dezembro de 2010

ALMA POSSUÍDA





Temerosa e alheia ao meu poder,
tomo de volta o que entreguei ao vazio,
ao nada.
Estas são minhas armas.
Estes são meus sonhos.
Acordo molhada e palpitante.

A influência dominante da lua me faz sensual,
sensível.
Sintonia secreta com meu sangue gelado.
Sou atirada contra as paredes de meu cárcere.
Caminho por uma vida,
vivendo em outra,
conhecedora apenas do presente.

Afasto-me do combate direto
ciente do lento efeito do meu veneno.
Sou capaz de me dissolver em lama.
Faço o mundo tremer em mim.

Deixo uma cicatriz na pele do chão,
que gira sob os meus pés descalços.
E quando paro de correr e sangrar
estou sentada no topo de uma montanha,
em uma dissolução absoluta de mim,
em minha alma possuída.




sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

REVELAÇÕES






Revelo-me toda.
Entrei neste jogo sem estar lúcida.
Como Savanarola,
com seus deuses,
eternidades e impurezas.
Já não penso mais – sinto.

Quando fico mais forte,
sou mais cruel.
Uma mulher para quem
a própria vida é um segredo.
Todas as minhas artimanhas,
minhas mentiras,
me são oferecidas de volta.

Arrisco destruir os edifícios de minhas ilusões.
Ardis de ilusões.
A ida aos bastidores
e o efeito causado em mim,
mesmo que seja uma miragem.
O resto é polir, arredondar,
aparar as pontas.
Atravesso a nado o mar de Sargaços.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

QUIMERAS


 




Por vezes não percebo meus pensamentos secretos.
Voltei às minhas quimeras.
Continuo faminta,
aterrorizante,
abjeta,
dramática,
esfumaçada,
densa,
rude.
Minha mente engasgada com meu sangue.
Apenas obedeci ao meu destino.

Na minha contraparte da vida,
quero realizar o amor,
mas ele me escapa.
Retira-se para as regiões mais rarefeitas,
irreais.
Pensei no que poderia ter sido
com mais impulso,
força,
vontade.

Preciso de amor,
fluxo,
evolução,
movimento.
Sentimento de segurança na multiplicidade
dos desejos.
Agora me demoro sobre minhas esperanças.
Preciso compreender.
Compreender significa amar.

CÉU E TERRA






Me sinto nua em meio à multidão.
Serpente e pássaro.
Não imaginava encontrar você em minha loucura.
Percebo sua presença, sua mente
permeando minha existência.
Um ecoar constante entre céu e terra.

Meu corpo se cansou de ser enigma.
Fluímos um para dentro do outro,
entrelaçamo-nos.
Fugitivos de um passado doloroso,
reencontramo-nos para forjar a unidade perdida.
Escrevo páginas de sonhos.

Tenho medo de tudo em minha fragilidade...
O primeiro arrepio do mistério sensual.
O céu entre nós e a terra –
o prazer.
Nem uma luz demasiadamente viva,
nem a obscuridade completa.
Cada um de nós possui sua alma própria,
e como eu,
você vagueia,
se perde,
explora,
dissolve,
me esquece.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

DENTRO SEM FORA





Novamente iço minhas velas.
Me torno tão humana que fico delicada.
Já posso me reconciliar com Deus porque sou livre.
Me observo com um olhar penetrante,
esta é minha sinceridade.

Sinto a vida e sinto o sonho,
ambos de modo absoluto.
Percebo sua presença em meu corpo,
em minha mente – permeando minha vida.
Ninguém sabe tudo que há em mim.

Caminho sonho adentro,
fiz meu desejo de refém,
o véu entre eu e a realidade.
Alio o profano ao sagrado,
libertada pela astúcia e delicadeza,
pela serpente emplumada,
pela plumagem e pela fluidez,
no raio e no arco-íris de um orgasmo.

INTENSIDADES




Um fogo misterioso,
leva-me à experiência do fantástico mais profundo.
Busco novas palavras,
novas regiões,
novos sentimentos.
Tudo é tão diferente,
                inspirações,
                criações,
                mentiras,
                insanidades.
Intensidade;
enorme intensidade interior.

Pensamentos debatem-se no ar,
cortam-no como asas metálicas.
Uma força secreta me impele
e me guia.
Uma necessidade inata da beleza,
                ordem,
ritmo,
amor
poesia.
Cada fibra do meu corpo exala música,
cada uma das fibras,
mesmo as que eu julgava adormecidas.

O desejo flutua no ritmo das algas.
Sonhos e fantasias,
como travessuras do vento,
derramam idéias com furor ensandecido,
ascendendo,
alargando,
o círculo a meu redor.
Modelei minha alma,
cinzelei meu espírito,
sublimei meu coração,
harmonizei todos os tremores do meu ser.


segunda-feira, 29 de novembro de 2010

MEU LABIRINTO





Hoje me refugio na beleza.
Sou a noite que lhe espreita através da cortina,
com olhos atentos,
vivos demais,
humanos demais.

Desfaço-me de toda certeza.
Aceito a felicidade relativa,
pois o absoluto...
O absoluto me assombra.
O caos me enriquece e alimenta.

O milagre se dá com sangue e alegria.
Laços vitais, ígneos, criativos e intelectuais.
Conquisto meu próprio corpo.
Faço as pazes com a vida,
com a relatividade do amor.
Finalmente sou fértil, abundante.

Deitada em minha cama,
sinto o fim da inquietude.
Seu sangue corre generosamente em mim.
Sou o guia de meu próprio labirinto,
para alcançar a superfície de seu mistério.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

VÍCIO SOLITÁRIO




Sigo assim:
lúcida e demente.
Toco a ausência que me queima a mão.
De silêncio em silêncio me enlouqueço.
Tão toda em você me perco.

E na violência da ausência,
de seu corpo contra o meu,
a vida arde intensamente.

No centro de meu corpo,
um grito se elabora,
grito rouco e sangrento.

E quando queimo meu sonho
estabelece meu inferno,
estabelecem minhas armas,
para que a alma se redima sem ajuda.

Será sobretudo uma mentira,
para aquele que não queima.

O meu sonho é vão.
que ele seja vão,
mas que seja sonho,
sonho
que ainda queimará meus olhos,
quando eu durma.

O meu incêndio.
Porque há alguém perdendo-se no fogo,
e há alguém crescendo-se para o fogo.
Que será a força,
e que se queima
nos vermelhos e quentes ventos do meu inferno.

ILUSÃO



O vago misticismo dos sonhos
deixou agudas farpas.
Um tempo se desdobrou do tempo,
como uma caixa,
dentro de outra caixa escondida.

Onde foi palavra,
resta a dura forma do vazio.
Onde foi carícia,
arde uma dose extrema de si mesmo.

A mudez assegura o deserto árido,
a planta morta,
seca.
Essas coisas feitas de palavras...
Essas coisas do descuido,
que esteve aberto de par em par,
e que em uma noite,
foi fecundado por quereres.

Que se queimem as bocas,
que copularam com a noite.

Os dias resolveram agora
morrer em crepúsculos de ferrugem.

SUSSURRO


Entre o querer
e a resistência da razão.
Entre cálices de palavras,
e queimação antiga
que não se exala à madurez destes corpos.
Onde vive o desejo implícito,
defendendo a fome
que na boca queima o ardor.

Língua,
luva simples,
que acaricia a pele há muito deserdada.
Véspera do instante
em que de repente se enlouquece.

O toque é traço,
letra, sol fictício,
porque a lua é crescente.
O dorso de brasas é estação de certezas.
Corpos multiplicados em fachos,
corpos perpassados em eclipses.

O que sinto passa através de mim.
E de mim ficou,
o que bóia na saliva de sua boca.
E de você ficou em mim,
o que não levo.

Resta um verso,
que não quer ser verso,
quer ser sussurro.
E que apenas contém,
uma parte de nós que é só vertigem.
Outra permanente.
Uma parte de nós que soube ser,
um eterno, de repente.

SILÊNCIO

                       

As lágrimas venceram meu esforço.
Sigo como planta de interior,
sem raízes profundas,
girando em direção à luz
que eu possa roubar do dia.
Flutuando na essência tenebrosa de meus sonhos.
Trazendo lembranças entrelaçadas.
Não posso distinguir sonho e realidade.
Opto pelo sonho.
E agora cada fibra do meu ser,
excita-se com o tesouro secreto
que teu silêncio contém.

PEDRA, PÓ E SILÊNCIO


O homem, contido
em pedra, pó e silêncio,
me espreita.

Vejo-o, reconheço-o,
tal como se, em profundo sigilo
dentro de mim,
algo o procurasse desde o início.

Me ilumino!
As manhãs são apenas a preparação.
Em que tempo mágico ele habitava,
antes que o olhar, detendo um pássaro no vôo,
do céu descesse?

Tão completamente nele me perco,
tão completamente nele me encontro,
que de mim se arrebentam as raízes do mundo.

Tamanha a singeleza,
das flores em suas mãos,
que minha neutra existência se quebra.

E seus negros olhos contra os meus,
fazem-me arder intensamente.
Disse de meu corpo
e de meus possíveis.
Disse da melodia das curvas e dos signos.
Tocou com as mãos meus prazeres.

Uma leve brisa na manhã que se inicia,
faz mover a sua túnica de pedra, pó e silêncio.
O vejo partir.

O homem é grave agora.
Começo a esperar a noite,
                                                talvez ela venha trazendo a lua.

SIMPLES ASSIM



O esboço de um sorriso que não sorriu,
na circunferência de minha solidão
silencia os desejos.
A grandeza dele preenche as feridas.
Um momento vivido passa por mim.
É um homem,
somado a tudo que contenho,
seus e meus medos.
Se fosse simples,
permaneceria assim,
desenhando em meus olhos
a curva da sua boca
no esboço de um sorriso que não sorriu.

Engulo sua gargalhada
como pão e vinho.
E sou envolvida,
e caio dentro de mim,
guardando em meu corpo
o esboço de um sorriso que não sorriu.

Por sua versatilidade multiforme
pude ouvir e sentir seu corpo.
Aspirar seus aromas,
me deixar aspirar.
E fugir... E me entregar.
Cobrir minha cama com palavras.
Cobrir meu corpo com seus gestos.
Porque vivo por impulso,
vivo por emoção,
vivo por excitação.
Se fosse simples
guardaria a incandescência derramada em mim,
marcada,
no esboço de um sorriso que não sorriu.

Me conta meias-verdades,
ouve meus passos,
segue-me com os olhos,
invade-me,
fecha os olhos,
e esboça o sorriso que não sorriu.

O homem que se debruça sobre meu corpo é suave,
e explora a alma
que habita meu corpo efêmero.
Meu corpo inteiro,
consciente do corpo deste homem
que se debruça sobre mim
e esboça um sorriso que não sorriu.

Se fosse simples...
Simples assim.

CREPÚSCULO





O vento que empurra a tarde,
suja de sangue as montanhas,
que resiste com doida esperança.
Que é o próprio desenho da vida,
e se esvai nas nuvens.
Sem pensar em amplas horas já iluminadas,
e na boca que diz:
Esperança.
Que pertence a qualquer um,
ou a ninguém é vinculada.
Onde está a vida
que em meu olhar se apaga,
ou acende.

domingo, 21 de novembro de 2010

SONHOS

É um sonho recorrente.
Quando piso na caverna de meus desejos,
caio na escuridão.

Sinto, ouço:
Sua voz mais rouca,
seus olhos mais pretos,
seu sangue mais grosso,
seu corpo mais forte.

Meus pensamentos se acendem,
suas mãos os detonam.

Desejo:
Faz mais uma vez,
faz-me sentir ainda uma vez.

Mergulho.
Vivo cada momento como um orgasmo,
com pausas entre os mergulhos.
Tremendo ora de frio, ora de febre.

E outra vez,
faz-me sentir ainda uma vez.
Como em meus sonhos recorrentes.

NOITE





Talvez tenha alma de Ravel,
que se repete acorde após acorde.

Talvez tenha o gênio de Van Gohg,
onde loucura busca perfeição.

Talvez tenha a saga insana de Garcia Márquez,
onde o amor vence o tempo,
e se encontra em outro tempo,
e se transforma em encanto.

Talvez seja só o adormecer,
que abarca o ontem,
o hoje,
o amanhã.

Talvez não tenha nome,
ou definição.

Talvez nem seja uma história.
Basta o fato de que tenha sido vivida.
Ou que se tenha acreditado nela.