segunda-feira, 29 de novembro de 2010

MEU LABIRINTO





Hoje me refugio na beleza.
Sou a noite que lhe espreita através da cortina,
com olhos atentos,
vivos demais,
humanos demais.

Desfaço-me de toda certeza.
Aceito a felicidade relativa,
pois o absoluto...
O absoluto me assombra.
O caos me enriquece e alimenta.

O milagre se dá com sangue e alegria.
Laços vitais, ígneos, criativos e intelectuais.
Conquisto meu próprio corpo.
Faço as pazes com a vida,
com a relatividade do amor.
Finalmente sou fértil, abundante.

Deitada em minha cama,
sinto o fim da inquietude.
Seu sangue corre generosamente em mim.
Sou o guia de meu próprio labirinto,
para alcançar a superfície de seu mistério.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

VÍCIO SOLITÁRIO




Sigo assim:
lúcida e demente.
Toco a ausência que me queima a mão.
De silêncio em silêncio me enlouqueço.
Tão toda em você me perco.

E na violência da ausência,
de seu corpo contra o meu,
a vida arde intensamente.

No centro de meu corpo,
um grito se elabora,
grito rouco e sangrento.

E quando queimo meu sonho
estabelece meu inferno,
estabelecem minhas armas,
para que a alma se redima sem ajuda.

Será sobretudo uma mentira,
para aquele que não queima.

O meu sonho é vão.
que ele seja vão,
mas que seja sonho,
sonho
que ainda queimará meus olhos,
quando eu durma.

O meu incêndio.
Porque há alguém perdendo-se no fogo,
e há alguém crescendo-se para o fogo.
Que será a força,
e que se queima
nos vermelhos e quentes ventos do meu inferno.

ILUSÃO



O vago misticismo dos sonhos
deixou agudas farpas.
Um tempo se desdobrou do tempo,
como uma caixa,
dentro de outra caixa escondida.

Onde foi palavra,
resta a dura forma do vazio.
Onde foi carícia,
arde uma dose extrema de si mesmo.

A mudez assegura o deserto árido,
a planta morta,
seca.
Essas coisas feitas de palavras...
Essas coisas do descuido,
que esteve aberto de par em par,
e que em uma noite,
foi fecundado por quereres.

Que se queimem as bocas,
que copularam com a noite.

Os dias resolveram agora
morrer em crepúsculos de ferrugem.

SUSSURRO


Entre o querer
e a resistência da razão.
Entre cálices de palavras,
e queimação antiga
que não se exala à madurez destes corpos.
Onde vive o desejo implícito,
defendendo a fome
que na boca queima o ardor.

Língua,
luva simples,
que acaricia a pele há muito deserdada.
Véspera do instante
em que de repente se enlouquece.

O toque é traço,
letra, sol fictício,
porque a lua é crescente.
O dorso de brasas é estação de certezas.
Corpos multiplicados em fachos,
corpos perpassados em eclipses.

O que sinto passa através de mim.
E de mim ficou,
o que bóia na saliva de sua boca.
E de você ficou em mim,
o que não levo.

Resta um verso,
que não quer ser verso,
quer ser sussurro.
E que apenas contém,
uma parte de nós que é só vertigem.
Outra permanente.
Uma parte de nós que soube ser,
um eterno, de repente.

SILÊNCIO

                       

As lágrimas venceram meu esforço.
Sigo como planta de interior,
sem raízes profundas,
girando em direção à luz
que eu possa roubar do dia.
Flutuando na essência tenebrosa de meus sonhos.
Trazendo lembranças entrelaçadas.
Não posso distinguir sonho e realidade.
Opto pelo sonho.
E agora cada fibra do meu ser,
excita-se com o tesouro secreto
que teu silêncio contém.

PEDRA, PÓ E SILÊNCIO


O homem, contido
em pedra, pó e silêncio,
me espreita.

Vejo-o, reconheço-o,
tal como se, em profundo sigilo
dentro de mim,
algo o procurasse desde o início.

Me ilumino!
As manhãs são apenas a preparação.
Em que tempo mágico ele habitava,
antes que o olhar, detendo um pássaro no vôo,
do céu descesse?

Tão completamente nele me perco,
tão completamente nele me encontro,
que de mim se arrebentam as raízes do mundo.

Tamanha a singeleza,
das flores em suas mãos,
que minha neutra existência se quebra.

E seus negros olhos contra os meus,
fazem-me arder intensamente.
Disse de meu corpo
e de meus possíveis.
Disse da melodia das curvas e dos signos.
Tocou com as mãos meus prazeres.

Uma leve brisa na manhã que se inicia,
faz mover a sua túnica de pedra, pó e silêncio.
O vejo partir.

O homem é grave agora.
Começo a esperar a noite,
                                                talvez ela venha trazendo a lua.

SIMPLES ASSIM



O esboço de um sorriso que não sorriu,
na circunferência de minha solidão
silencia os desejos.
A grandeza dele preenche as feridas.
Um momento vivido passa por mim.
É um homem,
somado a tudo que contenho,
seus e meus medos.
Se fosse simples,
permaneceria assim,
desenhando em meus olhos
a curva da sua boca
no esboço de um sorriso que não sorriu.

Engulo sua gargalhada
como pão e vinho.
E sou envolvida,
e caio dentro de mim,
guardando em meu corpo
o esboço de um sorriso que não sorriu.

Por sua versatilidade multiforme
pude ouvir e sentir seu corpo.
Aspirar seus aromas,
me deixar aspirar.
E fugir... E me entregar.
Cobrir minha cama com palavras.
Cobrir meu corpo com seus gestos.
Porque vivo por impulso,
vivo por emoção,
vivo por excitação.
Se fosse simples
guardaria a incandescência derramada em mim,
marcada,
no esboço de um sorriso que não sorriu.

Me conta meias-verdades,
ouve meus passos,
segue-me com os olhos,
invade-me,
fecha os olhos,
e esboça o sorriso que não sorriu.

O homem que se debruça sobre meu corpo é suave,
e explora a alma
que habita meu corpo efêmero.
Meu corpo inteiro,
consciente do corpo deste homem
que se debruça sobre mim
e esboça um sorriso que não sorriu.

Se fosse simples...
Simples assim.

CREPÚSCULO





O vento que empurra a tarde,
suja de sangue as montanhas,
que resiste com doida esperança.
Que é o próprio desenho da vida,
e se esvai nas nuvens.
Sem pensar em amplas horas já iluminadas,
e na boca que diz:
Esperança.
Que pertence a qualquer um,
ou a ninguém é vinculada.
Onde está a vida
que em meu olhar se apaga,
ou acende.

domingo, 21 de novembro de 2010

SONHOS

É um sonho recorrente.
Quando piso na caverna de meus desejos,
caio na escuridão.

Sinto, ouço:
Sua voz mais rouca,
seus olhos mais pretos,
seu sangue mais grosso,
seu corpo mais forte.

Meus pensamentos se acendem,
suas mãos os detonam.

Desejo:
Faz mais uma vez,
faz-me sentir ainda uma vez.

Mergulho.
Vivo cada momento como um orgasmo,
com pausas entre os mergulhos.
Tremendo ora de frio, ora de febre.

E outra vez,
faz-me sentir ainda uma vez.
Como em meus sonhos recorrentes.

NOITE





Talvez tenha alma de Ravel,
que se repete acorde após acorde.

Talvez tenha o gênio de Van Gohg,
onde loucura busca perfeição.

Talvez tenha a saga insana de Garcia Márquez,
onde o amor vence o tempo,
e se encontra em outro tempo,
e se transforma em encanto.

Talvez seja só o adormecer,
que abarca o ontem,
o hoje,
o amanhã.

Talvez não tenha nome,
ou definição.

Talvez nem seja uma história.
Basta o fato de que tenha sido vivida.
Ou que se tenha acreditado nela.